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Kill Show e a polémica do true crime

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Tenho que fazer um mea culpa porque um dos meus guilty pleasures é acompanhar canais de true crime no Youtube. Nem sei explicar porquê, mas há qualquer coisa que nos puxa para ser espectadores da tragédia alheia. Muitas vezes, como, por exemplo, uma das mais recentes histórias vinda dos Estados Unidos (onde mais acontecem estas coisas, não é verdade?) de um rapaz que, alegadamente, matou quatro estudantes universitários à facada numa residência universitária no Idaho, são coisas tão surreais que é quase impossível uma pessoa não pensar como é que é possível alguém ser responsável por um acto tão hediondo? O que é que leva alguém a fazer uma coisa destas? Porquê aqueles alvos, porquê aquela noite? Enfim, é difícil desviar o olhar. Havia tanta gente a falar do caso que o tribunal teve de impor uma ordem de silêncio para não serem divulgadas informações que possam vir a comprometer a investigação e o julgamento.

«Kill Show» fala sobre isso mesmo. No livro, há uma jovem de 16 anos chamada Sara que desaparece. A partir do momento em que se dá o seu desaparecimento, há um frenesim dos media à volta do caso (como sempre). Aqui, este frenesim é levado mais longe quando os pais decidem aceitar fazer um reality show sobre o seu desaparecimento. Para os produtores, o objectivo é ter audiência. Para os pais, o objectivo é encontrar a Sara.

Demorei algum tempo a entrar no livro pela forma como está escrito. Basicamente, só temos acesso às falas das personagens que estão a reviver tudo o que aconteceu 10 anos depois da Sara ter desaparecido. Mas, a partir do momento em que entrei na história, é um livro que se lê rápido numa ânsia de sabermos, afinal, o que aconteceu com Sara.

E, claro, não dá para não nos sentirmos culpados por sermos todos nós, ou termos sido em algum momento, espectadores da desgraça alheia. Falei há pouco de um caso muito recente nos Estados Unidos, mas poderíamos falar do desaparecimento de Madeline McCain, por exemplo. Fomos todos espectadores, todos tínhamos (e temos) uma opinião sobre o caso. Escrutinou-se tudo aquilo que os pais diziam e faziam, multiplicaram-se os livros escritos sobre o assunto, e até a Netflix fez uma série sobre o tema.

Acho que o livro faz uma crítica social importante. O frenesim dos media nestes casos é um pau de dois bicos. Se, por um lado, cria uma consciencialização de que alguém está desaparecido podendo levar a que essa pessoa seja encontrada, por outro, transforma a vida da família envolvida num inferno difícil de imaginar.

A versão portuguesa de «Kill Show» tem tradução de Célia Correia Loureiro e recomendo muito se gostam deste género de histórias.