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Ler, escrever e viver

Ler, escrever e viver

Pátria de Fernando Aramburu

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SOBRE A HISTÓRIA

Esta é a história de duas famílias que tinham boas relações entre si e que, depois, se tornaram inimigas mortais. A liderar estas famílias temos duas mulheres. Bittori e Miren eram unha com carne, amigas inseparáveis, quase irmãs. Acontece que estas duas famílias vivem no país basco.

Faço um parêntesis para vos dizer que o país basco é uma região do nordeste da Espanha onde se falava euskera, a língua do povo basco à qual são feitas muitas referências ao longo do livro. Ora, o país basco queria a independência de Espanha e, no final dos anos 50, foi criada a ETA, uma organização terrorista, que se tornou no maior símbolo do separatismo e que se prolongou por mais de cinquenta anos. Confesso que desconhecia completamente que a ETA extorquia dinheiro a empresários. Basicamente, obrigava-os a pagar um "imposto revolucionário" em prol da revolução e, se não pagassem, acabavam mortos.

É agora o momento de vos dizer que, se uma destas famílias tinha um membro que pertencia à ETA, a outra família perdeu alguém num atentado da ETA e é essa a base desta história maravilhosa.

 

SOBRE A LEITURA

«Pátria» pode parecer intimidante. Afinal, são 700 páginas de livro. Mas são 700 páginas de uma leitura fluida, de capítulos curtos (com 4-5 páginas cada um), cheios de personagens ricas em camadas. Em cada capítulo, mergulhamos na consciência de uma personagem diferente e, assim, temos acesso a todos os pontos de vista. O que une toda a história é um narrador delicioso. Um narrador que sabe tudo e que aparece e desaparece quase sem darmos por ele, porque Aramburu vai misturando a primeira e a terceira pessoa de maneira orgânica.

(...) tinha um meio sorriso na foto da parede com a sua cara de homem assassinável. Bastava olhar para ele para uma pessoa se aperceber de que um dia o matariam.

Tinha expectativas muito altas para este livro, só tinha lido coisas muito boas sobre ele e subscrevo tudo o que li. «Pátria» é um livro genial. É enorme e tem um contexto histórico complexo mas é um livro extremamente fluido, em que as páginas nos vão passando pela mão com a certeza de estarmos a ler um futuro clássico.

O livro foi um sucesso tão grande em Espanha que a HBO o transformou numa série que estreia já no próximo mês de Maio. Podem ver o trailer aqui.

Coisas da quarentena: filmes que recomendo

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Tenho-me lembrado bastante daquele momento do «Clube dos poetas mortos» em que se discute para que serve a literatura, o cinema, a música. Entre outras coisas, temos aprendido que servem para mantermos a sanidade mental no meio de uma pandemia.

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Alguns filmes que vi nas últimas semanas e que recomendo:

Mulherzinhas (2019): Li uma versão do livro (penso que encurtada) há alguns anos e não gostei muito. Mas gostei tanto deste filme que não podia deixar de recomendar. A irmã Jo vai contando a sua vida e das irmãs à medida que vai tentando publicar a sua história e ganhar independência. Trailer aqui.

Knives out (2019): Ver este filme é basicamente brincar ao cluedo. Há uma família com um pai milionário e todo um rol de filhos desejosos de ficar com o dinheiro do pai. Entretanto, o pai aparece morto depois de um jantar de aniversário e aparece um detetive privado a tentar perceber como, quem e porquê. Trailer aqui.

What if/the F word (2014): É provavelmente a minha comédia romântica preferida. É um filme leve mas muito bem escrito sobre a história de amor/amizade de dois peronagens: o Wallace e a Chantry. Não é recente mas se ainda não viram recomendo muito. Trailer aqui.

Uma lista de livros que podem mudar a vossa vida

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Já escrevi aqui sobre livros que me marcaram. Esse post foi escrito em Abril de 2016. Entretanto, passaram quatro anos e houve muitos livros pelo meio. Por isso, neste dia Mundial do livro aqui fica uma espécie de actualização com seis livros que mudaram a minha vida nos últimos quatro anos e que recomendo vivamente.

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Posts no blog sobre estes livros:

Trevor Noah nasceu um crime e tem uma história para contar | Razões para viver de Matt Haig | Uma educação de Tara Westover | Seneca e a brevidade da vida: palavras para guardar para a vida toda | A Coreia do Norte pelo olhar de Hyeonseo Lee | Estou viva, estou viva, estou viva de Maggie O'Farrell

20 posts em português para desanuviar

O intruso de Stephen King

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«O intruso» foi o segundo livro que li de Stephen King. Já tinha lido Carrie há uns anos atrás (e até escrevi sobre isso no blog) e não tinha gostado muito. Felizmente, gostei bastante deste livro.

Há um facto sólido, tão inalterável como a lei da gravidade: um homem não podia estar em dois sítios ao mesmo tempo.

É esta a premissa do intruso. Uma criança é encontrada morta e todas as provas apontam para o mesmo suspeito: Terry Maitland, o treinador de futebol da pequena cidade. O primeiro problema? Há provas de que Terry estava a quilómetros de distância quando o crime ocorreu. O segundo problema? Um homem não pode estar em dois sítios ao mesmo tempo.

A ideia para esta história é baseada num conto do Edgar Allan Poe que se chama William Wilson em que a personagem principal é perseguida pelo seu doppelgänger, um duplo. Em muitos momentos, «O intruso» também me fez lembrar o filme «Us» do Jordan Peele em que uma família é perseguida por duplos que são iguaizinhos a eles, fisicamente e em pensamento.

Achei genial a ideia da história mas também percebi finalmente porquê que muita gente refere que Stephen King se prolonga, às vezes, um bocadinho demais. O livro tem mais de 500 páginas e, apesar de ter gostado muito, houve momentos que poderiam ter sido mais curtos sem prejuízo para a história. Há também uma adaptação da HBO muito boa, sobre a qual já escrevi aqui.

Coisas da quarentena: a realidade implodiu

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Entre as muitas atividades online que têm surgido em tempos de quarentena, tenho-me dedicado a uma em particular. Descobri os workshops de "ghost writing" da The book of darkness and light. São gratuitos, feitos através do facebook e consistem numa série de exercícios de escrita de mistério/thriller/terror mas podem participar mesmo que não se entusiasmem por aí além por esse estilo de escrita. Mas bom, logo no primeiro exercício do primeiro workshop em que participei criei uma personagem que vivia num mundo pós-pandemia... No segundo exercício, lá me consegui abstrair da realidade e criar uma mini-história que não tinha nada a ver com o que estamos a viver. Será que já não nos conseguimos abstrair disto?


Entretanto estou a ler o «Viagens com o Charley» de John Steinbeck e deparei-me com esta frase que reli uma e outra vez para ter a certeza de que aquelas palavras não existiam noutra ordem qualquer e não tinha sido eu, por força das circunstâncias, a juntá-las assim:

Comecei a formular uma nova lei descrevendo a relação entre a proteção e o desânimo. Uma alma triste pode matar-nos mais depressa do que um micróbio.

Acho que não li nada mais verdadeiro em relação a tudo o que está a acontecer.

Coisas da quarentena: países diferentes, realidades iguais

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Uma das coisas boas desta fase de quarentena foi ter retomado contacto com um grupo com quem fiz voluntariado na Grécia em 2013. Parece inacreditável mas passaram sete anos. Temos feito conversas por videochamada. Estamos todos em diferentes países da Europa, mas estamos todos no mesmo  barco. Estamos todos em casa. Temos as mesmas restrições de só sair em caso de necessidade, a mesma distância dos outros, as mesmas regras a cumprir no supermercado. Os mesmos medos. As mesmas dúvidas. As mesmas perguntas.

E é assim que tenho acompanhado o desenvolvimento de um jardim na Irlanda, a reabilitação de um ouriço nas montanhas da Polónia, uns passeios de bicicleta algures em Inglaterra, as dificuldades em passar para o ensino online na Estónia. E tem sido bom, muito bom. Por isso, se há alguém com quem não falam há algum tempo, o coronavírus é uma óptima desculpa para mandar uma mensagem, perguntar se está tudo bem e, quem sabe, retomar uma boa conversa.

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