14 Henrietta Street: a casa de bonecas de Dublin
Como escrevi num post anterior, a zona norte de Dublin é conhecida por ter pessoas com menos capacidade económica do que a zona sul. Mas nem sempre foi assim.
As casas de Henrietta street foram construída anos anos de 1740s e ocupadas por políticos e outras pessoas importantes da Irlanda durante décadas. O número 14 foi construído com 5 pisos, com zonas dedicadas aos quartos de família, salas para receber convidados, e quartos no sótão para os criados.
A partir de 1801, com a passagem do Act of union que juntou a Irlanda e a Grã-Bretanha, os políticos mudaram-se para Londres, onde se passaram a concentrar os poderes. Dublin entrou numa fase de declínio e esta casa também.
Em 1876, a casa foi comprada por Thomas Vance que decidiu aproveitar a falta de habitação na cidade e alugou a casa a 19 pessoas, dividindo-a em pequenos apartamentos.
As condições eram inicialmente boas mas, com o passar do tempo, o número de famílias foi aumentando. Famílias inteiras partilhavam apartamentos compostos por duas ou três divisões, uma sala e/ou cozinha e um quarto onde dormiam pais e filhos. Todas as famílias partilhavam uma única torneira. As condições deterioraram-se muito com a sobrelotação e a falta de higiene típica da época.
Chegando a 1911, viviam 100 pessoas nesta casa! Desde costureiros, chapeleiros, e pessoas que trabalhavam noutras indústrias.
As condições da casa na altura. Fonte.
Apesar da degradação da casa e das condições progressivamente miseráveis de habitação, só nos anos de 1970s saíram os últimos residentes. Foram transferidos para apartamentos novos, com o objetivo de melhorar as condições de habitação da cidade.
E esta é a história de Henrietta street. A casa foi depois adquirida pela câmara de Dublin em 2000 e o museu abriria ao público 18 anos depois.
A minha primeira impressão de Henrietta comprovou-se na última sala, uma casa de bonecas em tamanho grande. A última sala tem objetos doados e é uma réplica daquilo que seria um apartamento durante os últimos anos em que a casa foi habitada.
O fascinante deste museu é a forma como nos é contada a história de uma casa. Onde viveram ricos, depois pobres. Onde Mary Usher (uma mulher da alta sociedade) deu à luz fechada num quarto numa cama caríssima e onde, anos depois, outra mulher viria a dar à luz num apartamento da cave, cheio de humidade e ratos, com os vizinhos a espreitar pela janela. Uma casa cujas transformações, ao longo dos anos, acompanham a história de Dublin, e dos seus habitantes.
O museu é relativamente recente e esteve aberto mais tempo com pandemia do que sem ela. Foi feito um trabalho hercúleo para o erguer, não só na restauração da casa, mas também em entrevistas com pessoas que lá viveram para a reconstituição o mais fidedigna possível da história da casa. Por tudo isso, e porque é um dos museus mais “fora da caixa” de Dublin, merece muito uma visita.