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Livros, viagens e tudo o que nos acrescenta

Elena Ferrante e Oz

história do novo nome - Elena Ferrante.JPG

Li o segundo livro da tetralogia de Elena Ferrante: "História do novo nome". Este livro marcou-me muito mais do que o primeiro, mas não necessariamente de forma positiva. Eu explico. No primeiro livro acompanhamos a infância de Lila e Lenú em Nápoles. Há muita violência, a vida é apresentada de forma crua, mas as personagens são crianças e, por isso, meras espectadoras da realidade dura que as rodeia. Neste segundo livro, já são jovens, deixaram de ser espectadoras e passaram a personagens, o que torna o livro mais interessante mas também mais duro. Gostei muito do livro mas tive de parar, algumas vezes, com raiva de alguns personagens.

“Mas naquela ocasião vi nitidamente as mães de família do bairro velho. Eram nervosas, eram submissas. Iam caladas, de lábios apertados e ombros descaídos, ou gritavam insultos terríveis aos filhos que as atormentavam. Arrastavam-se, magríssimas, com os olhos e as faces encovadas, ou com traseiros largos, artelhos inchados, peitos pesados, com os sacos das compras, e as crianças pequenas agarradas às saias a pedirem colo.”

 

Esta frase resume bem (sem spoilers) a ação principal do livro:

“Tudo neste mundo era periclitante, puro risco, e quem não estava disposto a arriscar ficava a definhar a um canto, sem ter intimidade com a vida.”

 

Enquanto lia este livro, decidi que o devia intervalar com algo mais leve e fui lendo "O feitiçeiro de Oz" de L. Frank Baun. Tenho o livro em casa desde criança e, se o li, não me lembro. Fiquei impressionada quando reparei que foi publicado pela primeira vez em 1900. É incrível estar a ler um livro escrito à 116 anos atrás, que ainda é um clássico e do qual quase toda a gente ouviu falar.

 

O livro conta a história de uma rapariga (Dorothy) do Kansas que, durante um tornado é transportada, com a sua casa e o cão para uma terra desconhecida. Quando chega, descobre que tem de caminhar até à terra do feiticeiro de Oz para ele a ajudar a regressar a casa. Pelo caminho, vai conhecendo alguns personagens invulgares - o homem de lata, o espantalho, o leão.

 

Gostei do livro e, quando o terminei, fui ver alguns vídeos do filme no youtube. Reparei numa cena, em que o espantalho caí, espalhando a palha pelo chão e diz: "There goes some of me again!”. A Dorothy pergunta preocupada: “Does it hurt you?” E o espantalho responde: “Oh, no! I just keep picking it up and putting it back in again.”

 

Fez-me lembrar a Lila da história da Elena Ferrante. Ao longo deste segundo volume dá a sensação que ela se perde e, em determinados momentos, tenta recuperar-se aos poucos para logo se voltar a perder.

 

E depois, deduzi que não, que não era só a Lila. Talvez a frase se aplique a todas as pessoas do mundo, em certas fases da vida. E fiquei a pensar em algo que li recentemente, que dizia que aquilo que leva as pessoas a ler é sentirem que pertencem à raça humana. Aquele sentimento de lermos uma frase com a qual nos identificamos tanto que nem conseguimos perceber como é que um escritor que vive outra vida, noutro país ou até noutro século consegue saber como é que nos estamos a sentir. Sim, talvez seja (também) por isso que lemos.